sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Abacateiro caprichoso



A Carmo gosta de abacates. Eu também.
Um dia ou uma noite, depois de ter comido um abacate, espetou três palitos no caroço e colocou-o semi-mergulhado, num copo com água.
Pouco depois, o caroço inchou, ficou sem pele, abriu, começou a enraizar e dali nasceu um belo abacateiro, que colocou num vasinho. Quando ele, abacateiro, atingiu uns 42 cm, perguntou-me se eu o queria, claro que sim, aceitei e plantei-o junto ao poço, no setor sul da Horta da Farmácia, na zona do pomar.
E ali ficou a crescer desalmadamente.
Quando chegava a altura de florir, desfazia-se em flores pequeninas, que à primeira brisa se despegavam e deixavam o chão como se tivesse nevado. Abacates, nem vê-los. Nem um – nem umzinho sequer para amostra. Passaram três anos, e tendo atingido já a altura da janela do primeiro andar, e eu cansado da cena primaveril, comecei a ameaçá-lo
- olha o serrote!
Mas um dia… nestas estórias há sempre um dia… um dia de primavera, com milhentas flores brancas e pequeninas, foi atingido por uma ventania. Nem sequer era um vendaval, foi só uma ventania, mas aquela árvore já com notável porte e alguma imponência, amuou e ameaçou cair. Inclinou, inclinou, mas não caiu completamente, e ali ficou toda inclinada a ver se metia dó ou se o serrote cabava de vez com o sofrimento.
- ai é? Então vais ficar aí, para aprenderes, disse-lhe eu.
As flores cairam, como de costume, mas desta vez não cairam todas. Comecei a ver que as que ficaram, começaram a transformar-se em bolinhas, cresceram e hoje são uma data delas quase adultas, abacates apetitosos do formato e tamanho de peras. Entretanto, coloquei-lhe uma escora, não fosse cair tudo ou dar cabo da tangerineira a que está encostado, e confesso que chego a comover-me arrependido de o ter ameaçado, mas ele estava a pedi-las.
É claro que o primeiro abacate será para a Carmo, que será informada e convidada para o ritual da apanha.



Mas a estória não acaba aqui.
Uma árvore naquele estado e naquela posição incómoda tinha os dias contados, e ela, o abacateiro, seguramente entendeu o meu arrependimento e o minha indecisão, ou se calhar decisão, a tal coisa do serrote, e quis redimir-se da birra de se ter deitado. E vai daí, reparem na segunda fotografia – do tronco do inclinado, mesmo junto à raiz, eis que nasce, aparece, cresce ou brota, o que se pode chamar um fogoso abacateiro. Curiosamente, e não sei porquê, com ar jovem, mas com raizes já bem adultas.

A natureza tem destas coisas, ou então, a inexplicável relação entre o reino animal e o vegetal

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